Interseccionalidade (ou teoria interseccional) é o estudo da sobreposição ou intersecção de identidades sociais e sistemas relacionados de opressão, dominação ou discriminação.[1] A teoria sugere e procura examinar como diferentes categorias biológicas, sociais e culturais, tais como gênero, raça, classe, capacidade, orientação sexual, religião, casta, idade, geolocalização e outros eixos de identidade interagem em níveis múltiplos e muitas vezes simultâneos. Este quadro pode ser usado para entender como a injustiça, as opressões e as desigualdades — sociais, raciais, epistêmicas, sistêmicas e estruturais — ocorrem em uma base multidimensional, sem serem suprimidas ou hierarquizadas.[2][3] A interseccionalidade sustenta que as conceituações clássicas de opressão dentro da sociedade — tais como racismo, sexismo, classismo, colonialismo, patriarcalismo, machismo, capacitismo, xenofobia,[4][5] bifobia, homofobia e a transfobia e intolerâncias baseadas em crenças — não agem independentemente umas das outras, mas que essas formas de opressão se inter-relacionam, criando um sistema de opressão que reflete o "cruzamento" de múltiplas formas de discriminação.[6]
A interseccionalidade é um conceito acadêmico, das ciências sociais, podendo ser usada como uma ferramenta analítica que pode ser adaptada para diversas formas, permitindo a análise de diferentes fenômenos e problemas sociais[7] para pensar as desigualdades, porém se desenvolve e abarca outros sentidos, como de ferramenta de intervenção política — com a apropriação dos movimentos sociais e da ONU, por exemplo, que a entendem como um instrumento político, de enfrentamento das desigualdades, e de identidade coletiva — em que alguns agentes — movimentos sociais, principalmente de mulheres, preferem se valer da interseccionalidade como um jeito de se autonomear. Resumindo, a interseccionalidade surge como conceito acadêmico de intervenção jurídica, mas sofre mutações e pode ser referida a partir dessas múltiplas possibilidades.[2]
A interseccionalidade é um paradigma importante no conhecimento acadêmico e em contextos mais amplos, como o trabalho de justiça social ou demografia, no entanto, as dificuldades surgem devido às muitas complexidades envolvidas no processo das "conceituações multidimensionais"[8] que explicam a maneira em que as categorias socialmente construídas de diferenciação interagem para criar uma hierarquia social, identidades subalternas, subordinações de gênero, de classe e de raça e de opressões estruturantes da matriz colonial moderna. Por exemplo, a interseccionalidade sustenta que não há experiência singular de uma identidade. Ao invés de compreender a saúde dos homens e das mulheres apenas pelo prisma do gênero, é necessário considerar outras categorias sociais como classe, habilidade, nação ou raça, para ter uma compreensão mais completa da gama de preocupações com a saúde destes - homens e mulheres.
A teoria da interseccionalidade também sugere que formas e manifestações de opressão aparentemente discretas são moldadas por uma outra (mutuamente co-constitutiva).[9] Assim, para compreender plenamente a racialização dos grupos oprimidos, deve-se investigar as maneiras pelas quais a racialização se estrutura, seus processos e suas representações sociais (ou ideias que pretendem representar grupos e membros do grupo na sociedade) são moldadas por gênero, classe, sexualidade etc.[10] Enquanto a teoria começou como uma exploração da opressão das mulheres negras dentro da sociedade, hoje a análise é potencialmente aplicada a todas as categorias — incluindo status geralmente vistos como dominantes quando vistos como estados independentes.
Como escreveu Kimberlé Crenshaw, "numa sociedade em que as discussões em torno da igualdade e justiça se tornam cada vez mais prementes, a compreensão da experiência humana deve evoluir para uma visão mais holística e abrangente".[3] A teoria da interseccionalidade emerge como uma resposta à limitação das análises que tratam as identidades de forma isolada. Em vez de considerar uma única dimensão da identidade, a abordagem interseccional reconhece que as pessoas estão sujeitas a uma miríade de formas de opressão e privilégio, que não podem ser dissociadas umas das outras. "O que muitas vezes chamamos de experiência é, na verdade, uma experiência de classe, uma experiência de género, uma experiência de raça"[3].